Trombofilia e gestação: a realização de um sonho.

Uma das causas de perda gestacional recorrente são as trombofilias. Existem pessoas que possuem predisposição a formação de trombos dentro das veias, local onde deveria se passar apenas sangue. Entende-se como trombo, um coagulo de sangue que pode circular pelo corpo e chegar a outros órgãos, formando a trombose venosa profunda (TVP); ou chegando ao pulmão, e assim formar o tromboembolismo pulmonar, condição de alto risco de letalidade.

Pode levar também a tromboses placentárias durante a gestação, causa comum de perda gestacional ou abortamento espontâneo. Entende-se abortamento espontâneo, a interrupção da gravidez antes das 20 semanas ou que o concepto tenha 500 gramas. Há outras causas de o porquê o casal perde, sendo delas é a mãe ser portadora de trombofilia. Existem dois tipos de trombofilias: as hereditárias e as adquiridas. Irei me ater a uma condição adquirida que é a mais frequente: a síndrome do anticorpo antifosfolipide (SAF) ou também conhecida como síndrome de Hughes.

Antes de mais nada, os fosfolípideos são estruturas que estão na membrana de qualquer célula do nosso corpo (seria como uma “casca” da célula). Há vários tipos de fosfolípides, por exemplo: cardiolipina, fosfatidilcerina, beta-2-glicoproteina. Na condição chamada de SAF, uma alteração auto-imune, que está presente inclusive em várias pacientes com lúpus eritematoso sistêmico, há um excesso de auto anticorpos que atuam contra essas estruturas do próprio indivíduo, e afetam a coagulação do sangue, podendo levar a trombose.

O tratamento da SAF é o uso de anticoagulantes, os famosos “afinadores de sangue” durante a gestação, em especial a enoxaparina (Clexane® da Sanofi). Nunca deve-se tomar essa medicação sem acompanhamento um médico, visto o risco de sangramento e outros riscos. A Sanofi emitiu recentemente (26 de abril de 2018), uma nota informando desabastecimento desta medicação, entretanto há outras medicações que também podem ser utilizadas.

Para o diagnóstico e manejo desta condição, necessita-se realização de avaliação clínica e exames complementares a ser solicitado por um médico geneticista ou obstetra especialista em abortamento habitual. Vale ressaltar que está indicado para mulheres portadoras de SAF esse acompanhamento, para enfim poderem realizar o sonho de serem mães.

Na imagem: uma foto de um ensaio “newborn” ou de recém nascido, de uma criança com 11 dias de vida, filho de uma mãe com trombofilia, que necessitou tomar uma injeção de enoxaparina por dia durante toda a gestação.

Caio Graco Bruzaca

Author Caio Graco Bruzaca

Médico geneticista pela Unicamp e Sociedade Brasileira de Genética Médica e Genômica (SBGM). Atuo em genética de casais (perda gestacional recorrente, infertilidade, casais de primos), medicina fetal, oncogenética e doenças raras.

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